quarta-feira, 11 de março de 2015

União dos oprimidos pelo politicamente correto anônimos

Ontem, aprendi em uma aula que vivemos sob a égide de uma ditadura do politicamente correto. Ah, que sorte a minha ter um professor assim para me abrir os olhos. Eu, que tolinha!, jurava que vivia em uma sociedade estratificada e preconceituosa, na qual, aliás, era super cool fazer piada com tudo que não fosse lindo-loiro-hétero. Mas, depois de acordar desse devaneio esquerdista – só pode ter sido mesmo a maldita faculdade de História – pude enfim ver em que pé vão as coisas.

Saí da faculdade levemente atordoada pela revelação, mas imediatamente constatei sua veracidade. Em meu caminho até minha casa casa, nenhuma propaganda que dissesse que mulheres são loucas consumistas ou que devem preparar um bom jantar com “amor”. Várias bancas de jornal no caminho e nenhuma (ne-nhu-ma) parede recoberta de corpos femininos artificialmente perfeitos para minha pilulazinha de depressão diária. Poxa, como vou viver sem um santo outdoor no qual venho de brinde na compra de uma garrafa de cerveja? Muito opressor, cara.

Desnorteada, cheguei em casa e liguei a TV. Ela, decerto, salvaria meu dia. Ah, que ledo engano. Nas novelas, personagens negras tinham histórias próprias, não eram só empregadas domésticas e porteiros. Espera que piora. As mulheres negras não apareciam só como mulatas-sensuais-sedutoras! O auge da repressão enfim chegara! Encolhi-me no canto do sofá, acuada e deprimida, quando me lembrei: há uma luz no fim do túnel. Os programas de humor me salvariam. Respirei aliviada ao achar um passando. Há, qual o quê! Nenhum gay histérico e promíscuo, nenhuma mulher gostosa burra, nenhuma mulher “feia” sofrendo abuso sexual no metrô e me dizendo que isso era uma sorte. Ah, vá lá, nem estava pedindo muito. Só um relatinho de estupro de mãe de santo para salvar a pátria. Mas nada. Ah, malditos ditadores do politicamente correto que destruiram a cultura nacional.

Último recurso desesperado: a internet. Um comentariozinho enraivecido já me daria esperança de um futuro melhor. Mas – sim, é o ponto final da linha, amigos – em um post contra a presidenta da república só encontrei contestações políticas ao seu governo, só divergências ideológicas e acusações contra seu partido. Nadinha sobre sua vida sexual, minha gente? Nem uma referência sobre sua aparência física? Agora me diz, onde esse país vai parar? Contra um político da oposição tampouco achei alento nas críticas, nem um viadinho, nem um – ops, contra homens-brancos-héteros nunca tivemos xingamentos baseados em preconceitos mesmo.

Sentei-me novamente ao sofá encarando tristemente o vazio. Como pretendem que eu explique aos meus futuros filhos (porque é irrefutável que os terei. fui criada quando a mídia ainda podia me convencer que eu não seria mulher se não tivesse filhos, graz-a-deus) que não posso usar a expressão “preto de alma branca”? Vou ter que dizer que ela não faz o mínimo sentido porque as pessoas são iguais? Querem mesmo que eu diga para eles que dizer sapatão e viadinho não significa nada porque identidade sexual não é xingamento? Alôu, que mundo seria esse pra se criar uma criança?

Sinceramente, agora falando enquanto mulher, como vou viver sem minha dose diária de objetificação, infantilização e incentivo ao estupro? Como vou construir minha identidade assim?

Que bom a gente ter um professor atento à realidade do país.



Nenhum comentário:

Postar um comentário